TARMINA E O MUNDO DISTANTE
Era um mundo distante.
Tarmina, de uma famÃlia pobre como a maior parte dos meninos que conhecia.
Entre as crianças como ela o medo era ser entregue enquanto escrava a um algum homem da guerra.
Quando tinha doze anos propuseram ao pai um determinado guerrilheiro. Mas as negociações falharam. E agora, aos quatorze, era certo e sabido que não ia escapar.
A irmã mais velha fora abandonada num campo deserto. Tinha já a vetusta idade de 23 anos. E dera à luz oito filhos dos quais não sabia do paradeiro.
O pai só conseguia dinheiro vivo vendendo as filhas.
A irmã mais nova tinha onze anos, mas já era cobiçada.
Nunca perguntava nada ao pai. À mãe, sim.
Ela dizia que não havia nada a fazer. Era o destino.
Questionava sobre a Europa onde as meninas até aos dezoito anos eram consideradas crianças, estudavam e só casavam se quisessem.
- São os paÃses dos ricos e não dos pobres. Onde há riqueza, as meninas têm uma vida de luxo. Mas não te preocupes. Talvez algum homem da guerra te trate bem-.
No grupo das raparigas que se juntava no pátio não havia ilusões. Seriam vendidas mais dia menos dia.
Os guerrilheiros apreciavam carne fresca. E rodeavam-se de crianças.
(A Europa era referida como um paraÃso. Como chegar lá?).
Dizia-se que se um homem maltratasse uma mulher, chegava a ir preso.
Que estranho.
E em outros paÃses do mundo também se vivia bem.
Um dia perguntara à velha irmã como fora a sua experiência.
Ela chorava. Nem queria abordar tal assunto.
Sem estar à espera, súbito, o pai disse a Tarmina que já lhe arranjara um guerrilheiro.
Teriam de se deslocar a um local, onde a levariam.
Tarmina desatou a chorar convulsivamente.
O pai esbofeteou-a.
- Cala-te-.
No dia seguinte, de madrugada, lá foi.
Tudo muito rápido. Enfiaram-na na parte de trás de um carro escuro.
Tremia de medo.
Mas, que remédio. Era o destino.
Mais de duas horas de viagem e chegaram a um local ermo.
SaÃram. Dentro de uma casa em mármores, foi conduzida por uma mulher a um quarto onde a lavaram e a prepararam para conhecer o dono.
O corpo com a fadiga do mundo.
Sentia-se mal e quase a desmaiar.
Deram-lhe um lÃquido.
Surge então o guerrilheiro.
Sem falar, despe-a brutalmente.
Penetra-a com violência.
(Ele nem tirara as vestes).
Após o ato, vai-se embora.
Ela, dolorida em extremo, contorce-se de raiva. Não consegue adormecer.
E nas noites seguintes teve a visita do homem.
Já não havia margem para o pensamento ou para o sonho. Era o pesadelo da existência.
Ficou grávida.
Da famÃlia nunca mais soubera.
Ia para uma espécie de salão onde estavam outras raparigas grávidas ou marginalizadas.
Falavam entre si a medo.
A guardiã já tinha muito idade. Ia pelos trintas.
Entretanto constou que o homem da guerra já conseguira mais duas meninas de doze anos.
Tudo era dito com meias palavras. É que havia as delatoras.
Tarmina soube que o dono, após a gravidez, queria entregá-la de presente a um outro senhor.
Ficou despedaçada.
Quem não alinhasse, bem podia morrer ou ficar desfigurada.
Falava-se com receio de uma jornalista ocidental que andava a pesquisar o destino delas .
Mas a este refúgio não chegava ela, de certeza.
Quando pariu o filho, retiraram-no e nunca mais o viu.
Passados uns dias já estava preparada para ser entregue a outro homem.
Não havia como escapar.
A realidade pura e dura.
Passar de dono em dono até à rejeição.
Um mundo distante. A pele estigmatizada e violentada.
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