quarta-feira, março 23, 2022

Que o barulho das armas acabem, paz 💛💙


 Hoje é um dia muito importante para todos os portugueses, ou pelo menos para a larga maioria dos nossos concidadãos. Porque hoje a democracia completa 17500 dias, mais um do que os longos e penosos 17499 durante os quais se arrastou o regime autoritário do Estado Novo. E se ainda vivêssemos em ditadura, minhas amigas e meus amigos, a nossa vida seria muito diferente. A minha, a vossa e a daqueles que acham que isto é tudo uma grande conspiração e que no tempo do Botas é que se estava bem.  


Podia aqui alongar-me sobre a pobreza ou sobre a fome, sobre a guerra absurda nas colónias, sobre a censura, a tortura ou a inexistência de liberdade, sobre o analfabetismo ou sobre a falta de cuidados de saúde. Podia falar no contraste entre a miséria geral e o fausto das elites, avós e bisavós dos Ricardos Salgados que faziam com Salazar mais ou menos o mesmo que os netos fizeram com os Sócrates desta vida, mas vou antes olhar à minha volta, para as coisas simples da vida. 


Se ainda vivêssemos em ditadura, a Fábia seria discriminada por ser mulher, teria menos direitos e, ditava a moral e os bons costumes, deveria ser uma mulher do lar, com todas as tarefas a seu cargo, que passar ou cozinhar não eram coisas de macho. Ter uma carreira profissional seria uma miragem, ter a liberdade de se vestir como bem lhe apetecesse seria outra. A Fábia seria, como praticamente todas as mulheres durante o Estado Novo, uma subalterna dos seus maridos. Uma emprega doméstica com poucos a nenhuns direitos. 


Se ainda vivêssemos em ditadura, o Eduardo corria sérios riscos de ser um menino que brincava na rua descalço, com a roupa suja e rasgada, que era a que havia, e o lanche, quando houvesse, seria uma peça de fruta, caso as houvesse no quintal, ou uma côdea de pão duro. A subnutrição estava garantida e seria um mal menor, num tempo em que mortalidade infantil era uma realidade trágica, absolutamente incomparável à dos tempos em que vivemos. Os estudos, seguramente, ficariam pela escola primária. O analfabetismo seria uma certeza. 


Se ainda vivêssemos em ditadura, e eu fosse a mesma pessoa que sou hoje, o mais certo era estar preso. A maior parte de vocês só me conhece daqui. O que já me conheciam antes d’O pai já vai sabem bem que eu estaria na fila para ser admitido no Tarrafal. Ou então viveria no medo, sem outra perspectiva que não fosse sobreviver. Ou estaria no Ultramar, como o meu pai, os meus tios, o meu saudoso sogro ou os pais de vários amigos meus. Talvez voltasse de lá traumatizado para sempre, talvez não voltasse sequer. 


Se ainda vivêssemos em ditadura, a nossa vida seria - ninguém me convence do contrário - imensamente pior que a que temos hoje. Seria mais triste, mais sombria, sem perspectivas, sem segurança, sem futuro. Claro que para os privilegiados nascidos nos anos 80 (é o meu caso), que veem a democracia como algo adquirido a garantido para sempre (não é o meu caso), é fácil dizer que as coisas hoje estão mal. E, claro, não vou ser eu que vos vou dizer que isto está uma maravilha, porque não está. Impostos elevadíssimos sem retorno proporcional, falta de estruturas e de profissionais de saúde, falta de creches, divida pública estratosférica, salários demasiadamente baixos para um Estado-membro da União Europeia, enfim, nunca mais saía daqui. 


Mas querer comparar tudo o que já conseguimos, tudo o que conquistamos, todos os direitos, liberdades e garantias, toda a protecção social e o Estado-providência que construímos, com as trevas do Estado Novo, com a fome, a censura, a repressão e a morte sempre à espreita, é, a meu ver, um completo absurdo. Com as suas falhas e imperfeição, a democracia é, de longe, o melhor de todos os sistemas. Por isso lutaram os nossos avós, por isso lutam hoje milhares de homens e mulheres na Ucrânia. Porque querem ser livres. Como nós.


Viva a Democracia! Viva a Liberdade! ❤️💚

Ps:  Usem o amor para curar as feridas, usem o amor para refortalecerem e Ucrânia muita força... 💛💙



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